
Acho uma delícia revisitar os autores. Imagino o quanto do próprio leitor impregna a obra, a tal ponto de fazer a releitura, uma operação divertida e surpreendente.
Sempre me lembro que quando me divorciei, li
A Peste - eu sei, eu sei,
Camus foi escolha equivocada para o momento - e fiquei barbaramente impressionada com o livro. A idéia de estar acuado, limitado, impossibilitado de se deslocar, o medo presente, foram extremamente impactantes para mim.
Anos mais tarde, ainda que tenha gostado da mesma forma, não senti a asfixia da primeira leitura, pois minha localização, enquanto leitora, era outra.
Lembro perfeitamente do impacto que senti quando li
1984 pela primeira vez. Era adolescente e de lá pra cá, reli umas tantas vezes. Fiz isso por esses dias.
A ácida crítica de
Orwell tem o poder de ser atual, ainda que a esquerda tenha se remodelado. Creio que todas as críticas gigantescas que ele faz, cabem em qualquer estrutura totalitarista, pois o controle é sempre sua base, mas é indiscutivelmente - infelizmente - que os socos atingem ao que muita gente - como eu, por exemplo - sonhou durante muito tempo.
Imagino que a esquerda só poderá ter uma nova face, que responda às necessidades comptemporâneas, se tiver a coragem de enfrentar discutir elementos como esse.
Discutir a ficção macabra que teve base em uma realidade não menos macabra, como foi o punho solene de Stálin.
Por mais que a direita me enoje - e me enoja totalmente - não posso mais deixar de ver o mundo sem as reformulações, sem a
perestroika, sem a
glasnot e sem...viva!..o
Grande Irmão.
De certa forma, isso me deixa angustiada, me deixa com a síndrome de
geração coca-
cola, pois ao criticar e ter ojeriza ao capitalismo, não encontro esperança no que pensava ser o socialismo.
De mais a mais, conheço pessoas tão controladas, tão vigiadas, que vivem uma vida sem o mínimo de privacidade, em um arremedo assustador da ficção de Orwell.
O que prova, sem dúvida, que os controladores se mordem de medo de perder seus controlados....e isso seria tão, tão interessante.
***publicado originalmente em 2008.