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20 setembro 2010

Dicionário de Gogoiês


Pra quem conviveu com minha avó Gogóia, era fácil entender. São termos antigos, uns reais, outros inventados por ela mesma.












Babilônia: mulher desarrumada, com roupa estranha. Pode ser substituido por "mal ajambrada". ex: " Olha aquela babilônia ali, ah,que coisa...!"

Guarda Vestidos :guarda roupa, ainda que seja de homem.Ex :"pega ali,no guarda vestidos dos meninos.".

Os "meninos":os sete filhos bigodudos.

As "meninas":as cunhadas velhinhas.


prestimosa : moça prendada e com iniciativa.



ajutório: Ajuda, auxílio nas coisas da casa. "Vivinha, você não vai dar um ajutório pra sua mãe?"


escrúpulo :nojo . Ex " Fulana não come isso, você sabe, ela é muito escrupulosa".



consetir : permitir, deixar.ex: "Papai jamais consentiria isso."

Tágio : apelido do irmão favorito, Carlos.


incomodada : menstruada.



escurruluimcumtrim : acabou. Não, não me peçam pra explicar, não faço a menor ideia.


macaco-do-rabo-comprido: aquele que pede de volta um presente que recebeu, baseado em uma historinha que ela contava. ex;" Devolve isso pra ela, seu macaco-do-rabo-comprido!"

$$$$ Ri muito.Alguém me "explicou" o significado correto para a palavra escrúpulo....rsr....bom,pessoa não-leitora, se ela usasse dentro do código correto...não teria porque estar nessa lista,certo?
ah,adivinha! Babilônia também significa outra coisa...rá!

08 fevereiro 2010

As moiras


Eu estava saindo do supermercado,com minha mãe. A velhinha me abordou:
- oi. Você pode me levar pra casa?
Foi tão rápido, respondi sem pensar:
- claro que posso.
Minha mãe foi racional:
- Mas a senhora está sozinha? Com quem a senhora veio?
Ela explicou que tinha vindo sozinha, mas que era difícil voltar de ônibus, com as compras. Olhei as compras dela, sacolinhas amarradas em um carrinho de feira.
Fomos pro meu carro, mas era difícil colocar o carrinho de feira na mala.
Ela organizava:
- Nós três juntas vamos conseguir, vai, vamos lá, um, doi,três!!!
Tive de chamar um funcinário pra ajudar, ela falava, lúcida e animadamente.
Contou que era sozinha, não tinha casado ou tido filhos, que tinha tido uma sobrinha que a ajudava, mas a sobrinha havia morrido.
Ela parecia minha avó, falava como minha avó e aquilo me doeu de forma insuportável. Eu dirigia e chorava , achando ótimos poder esconder isso nos óculos escuros.
Pensei naquela cena insólita: na tríade feminina, a mulher, a senhora e a velha.
Tenho mania de achar que tudo é um sinal, tudo significa algo além do que posso ver. Aquele dia, pra mim, foi um sinal.
Me comovi com a velha e sua solidão, me comovi com a velhice que iria chegar pra minha mãe e pra mim, me comovi com a saudade descomunal que sinto de minha avó.
Ela contou da vida, falou muito, me abençoou. Disse pra chama-la de Detinha, porque todo mundo a chamava assim.
Deixei dona Detinha em um prédio de classe média, onde o porteiro veio ajudar a tirar o carrinho e a velhinha. Muito cuidadoso com ela, porque ela inspira isso.Eu disse que era perigoso, que ela não deveria fazer isso, mas ela riu e disse que sempre tinha gente boa no mundo, gente pra ajudar.
Abracei chorando a d.Detinha, esperando que ela continuasse com essa gana de lutar contra a solidão e com esse jeito de avó.




***Publicado originalmente em março de 2007.

19 dezembro 2009

O Tempo e o Vento de Benjamin Button






"- O que você está olhando?
- O vento."

Com esse diálogo que me remeteu, imediatamente ao delicioso Tempo e o Vento de Érico Veríssimo, começa O Curioso Caso de Benjamin Button.
Como no romance brasileiro, o filme norte americando - adaptação de um conto de Fitzgerald, de quem nunca gostei muito - pauta sua narrativa no vento. O vento aparece como metáfora para as mudanças, convergindo para a inevitável morte da mãe idosa, ao mesmo tempo em que o Furacão Katrina assola Nova Orleans.
A filha lê o diário de Benjamin para sua mãe, que na cama de hospital, na eminência da morte ( e do furacão), decide contar parte de sua vida, até então, guardada apenas em sua memória.
O filme trabalha com algumas coisas que adoro: narrador, que imprega uma intimidade com o espectador; flash back que sempre me envolve e a atmosfera mágica dos sedutores contos de fada.
Assim, a história narra a vida do bebê que nasce velho e que ao crescer, passa a ser, paulatinamente, mais jovem. Nessa caminhada, reflete - e faz refletir - sobre as escolhas da vida e sobre a possibilidade do recomeço, da releitura da própria vida. Sempre pautado pelo vento.
Ao se tornar cada vez mais jovem, cada vez mais criança, faz o parelo perfeito entre os velhos/crianças, já que esses parecem dividir não só as pequenas alegrias, como as grandes dependências dos adultos, aqueles que estão no meio desses dois pólos.
Eu chorei, que me desmilingui. Daniel fica durão, nunca chora, tira sarro do meu choro fácil. Michelle, que já havia assistido, disse que chorou duplamente, porque como já sabia o que vinha, chorava por antecipação.
Em um dado momento da vida de Button, quando ele está crescendo/remoçando, ele tem um quê de Marlon Brando em O Último Tango em Paris ( sacumé? meio caído, mas ainda irresistível?) e nessa hora, Michelle me cochichou exatamente o que eu estava pensando:
- Ops, Vivinha...nesse ponto aí, eu já pegava....
E é claro que a beleza absurda de Brad Pitt aparece com sua força total, momentos depois, de forma que chego a duvidar que alguém possa ser realmente tão inenarravelmente atraente. Chega a doer nos olhos.
O filme é delicado e a emoção que desperta passa longe da pieguice. É um daqueles filmes que fazem você sair meio torto, meio feliz, meio angustiado, meio embolado em tudo isso.
Vá, chore muito e me conte tudo.







****post publicado originalmente em fevereiro de 2009.

01 novembro 2009

Lúcio 80/30


Na sexta feira, enquanto eu tomava um café com a Lidiane - a fofa blogueira do Bicha Fêmea - apareceu, toda esbaforida, uma vizinha e amiga.
Ela, Cláudia, havia ganhado dois ingressos para uma peça em cartaz no teatro de Paulínia e estava me procurando para irmos. Fomos, claro, eu topei na hora, sou sempre facim, facim quando o programa é bom.
O teatro é uma construção monumental. Cafona, como é praxe nas construções de Paulínia, famosa aqui na região por seus portais horríveis.
O interior do teatro, entretanto, se mostrou confortável, grande, bonito, bem estruturado. Muito maior do que os teatros de Campinas e, sem dúvida, multo melhor aparelhado.
A peça em questão era sobre Lúcio Mauro e Lúcio Mauro Filho, ambos comediantes com anos de estrada, bem digeridos pela Globo.
O fato é que a idéia de fazerem um trabalho juntos vem no momento em que o pai tem um piripaque e vai para o hospital. Na noite em que passa fazendo companhia ao pai, filho tem a sacada: eles devem fazer uma peça, uma peça juntos.
Assim, a peça é sobre a peça: como montar, o que dizer, quem chamar.
A brincadeira com a metalinguagem dá o tom da obra.
Eu gostei, ri, achei uma graça a platéia aplaudir várias vezes em cena aberta. Entretanto, acho que o momento poderia ser aproveitado com alguns causos da história de Lucio Mauro, coisa que eles fazem pouco. Acho que o momento remember poderia ser mais explorado até para alguns ajustes de contas, que sempre ficam.
Achei tocante quando o filho, negociando um tempo a mais para o pai, diretamente ali, com Deus, diz;
"Eu sei que ele já fez tudo que queria, viveu bem, eu sei que ele está preparado pra ir. (pausa) Eu é que não estou"
Rindo ou achando comovente sem ser piegas, me diverti muito.
Recomendo, crianças.

04 junho 2008

Vivinha em São Paulo III ou O ônibus


Quem me conhece, sabe que eu faço promessas internas.Por exemplo, quando tinha onze anos jurei que nunca namoraria um homem que lavasse carro no domingo, assistisse futebol e tivesse barriga de cerveja.
Bem que eu preciso de uma dietinha, mas os homens que passaram por minha vida não precisam. Nem lavam carro. Muito menos assistem futebol com barrigão de fora.
Uma das juras é que eu evitaria até o último segundo a possibilidade de tomar ônibus. Mas nesse caso, diferentemente do hipotético barrigudo, eu estava cansada de conhecer.Tomei muito ônibus: vazio, cheio, limpo, sujo, hora vazia, hora do rush.Chega, sem essa de ônibus.
Mas aqui eu andei, quando fui pra casa da Lu Farias, onde conheci aquela família linda e atenciosa, onde passei uma tarde muito bacana, papeando, tomando café e vendo que existem outros fãs de Babylon 5 no mundo.Essa possibilidade de conhecer melhor os amigos blogueiros é algo que me deixa feliz.
No ponto de ônibus,rumando para a casa da Lu, uma menina pequena me olhava:
- Que cor "é" seus olhos?
- castanhos - respondi.
- tira o óculos "preu" ver?
Não é o máximo como criança simplesmente consegue se comunicar com todos?
Por mais que eu deteste tomar ôninus - e eu já disse que detesto - é bacana perceber como dá pra se conhecer mais das pessoas, pra trocar coisas, pra ver outras vidas que não a minha apenas.
Minutos depois sentou uma velha. Constrangida, me pediu um real. Dei três, ela riu sua risada sem dentes, disse que ia dar "até pra comprar leite".
Eu já estava com vontade de chorar ali, velhos me comovem, velhos solitários me cortam o coração.
Essa velhinha mora sozinha, as filhas moram no interior do Paraná, disse que morava em São Paulo há anos, ainda ficava aqui porque era mais fácil para se tratar, para pegar remédios no posto de saúde, essas coisas.
Tirou os remédios da sacola, me explicou pra que serviam, na ânsia de papear com alguém.Um toque escatológico aliviou tudo, ela dizia:
- esse aqui é pra eu urinar bem, por causa do rim, sabe? ah, mas eu urino...urino que é uma beleza.
Eu ri da história de xixi da velhinha e continuamos conversando. Ela contando, eu escutando e pensando em um clichê que me pareceu doloroso: em uma cidade tão imensa, quantas pessoas seriam solitárias como aquela velha que andava sozinha, morava sozinha e conversava com uma estranha, após pedir um real.
A solidão dela me cravou nos ossos, doeu, assustou.
Ao entrar na casa da Lu, momentos depois, recebi uma golfada de felicidade: uma família amorosa, alegre, unida. Fiquei pensando na nossa sorte e fiquei pensando na velhinha.


**** texto publicado originalmente em julho de 2007.