Não é difícil dizer porque me fascinei tão rapidamente pelo movimento anarquista.
Porque esses militantes, ainda no início do século passado, já compreendiam as mulheres como cidadãs, como pessoas que podiam estudar e produzir.
A experiência de ler os vários jornais anarquistas foi uma porta aberta logo no primeiro ano da graduação, onde não só aprendi as delícias de me perder horas em arquivos antigos, como as delícias de um movimento revolucionário até a última gota, como foi o dos libertários.
O incrível nesses caras é que dentro de uma estrutura escolar violenta, autoritária, dogmática e cerceadora, eles criaram escolas mistas, onde os alunos podiam frequentar laboratórios, debater e - maravilha das maravilhas - não havia avaliações, não havia classificações com notas.
As avaliações deveriam servir para que o aluno percebesse suas falhas, seus limites, não para que fossem excluídos ou que houvesse competição feroz, ou pior ainda, que fossem vítimas de vinganças de professores hostis.
Claro que agora, com todos os alunos enlatados na concepção de que é necessário haver nota, fica praticamente impossível nadar contra a maré. Estudar sem esse tipo de avaliação requer uma autonomia, uma independência, elementos que os alunos poucas vezes são estimulados a ter atualmente.
Há alguns anos, pensei em escrever um trabaho comparando a concepção de imprensa que eles tinham, com a veiculada na chamada imprensa burguesa.
Não escrevi esse trabalho, mas participei de duas pesquisas que incluiam os ácratas e isso me deu a oportunidade de ficar horas no Arquivo Edgard Leuenroth, lendo sofregamente jornais como
A Plebe, O Amigo do Povo, A Barricada, A Luta Livre, entre tantos outros.
Fiquei familiarizada com eles, um círculo não tão grande, mas incrivelmente ativo, que usava a imprensa como arma, mas não se limitava a ela. Os anarquistas usavam os sindicatos e os centros culturais, demonstrando a compreensão do poder que a cultura tem sobre o coletivo.
Talvez eu tenha me convencido, naquela época, que uma sociedade sem Estado seria possível. Hoje, certamente, essa idéia não me toma. Mas penso como esse ideário pode ser modificador dentro da sociedade, no sentido de perceber o indivíduo como autônomo, como sujeito de sua própria História ( me perdoem pelo clichê necessário..)
Mas só posso dizer que toda a influência deles, em minha vida, foi enorme. E estar com eles, durante aquele tempo, ali no
Arquivo, foi deliciosamente inesquecível.
Melhor do que isso, impossível.