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Quanto eu tinha 22 anos, namorava J., que viria a ser meu marido e pai de Daniel. Ele era um aficionado por HQ, colecionador e responsável por minha total conversão ao universo dos Quadrinhos.
Passamos nosso primeiro
reveillon juntos em Paraty e foi aí que conheci
Wachtmen.
Pra quem não conhece - pare de ler esse texto, vá comprar e ler, rápido, rápido! - é uma
graphic novel brilhante, escrita por
Alan Moore e colocada no papel por
Dave Gibbons.
É um clichê dizer que Wachtmen revolucionou a cena HQ, mas eu preciso repetir esse clichê, porque revolucionou também todo o meu olhar para essa gama de personagens e histórias. Depois de ficarmos na festa de Ano Novo, voltamos para a pousada em que estávamos hospedados: me atraquei com o Quadrinho e li, inteiro, até o amanhecer.
Foi meu reveillon com Alan Moore. Como boa compulsiva que sou, simplesmente não conseguia parar de ler aquela maravilha, que era diferente de tudo que eu havia lido.
Wachtmen trabalha com uma década de 80 paralela, onde gangues dominam as ruas, a ameaça de guerra nuclear é eminente e Nixon está estatelado no poder.
Dentro disso, a HQ transita em três tempos específicos: a década de 40, onde os Minutemen se fantasiavam e saiam às ruas para defender os norte-americanos e eram ovacionados por isso; na década de 60, onde um grupo tenta recriar isso, tendo apenas o Comediante da "turma antiga" e a década de 80, onde os mascarados cairam na ilegalidade, sendo hostilizados por boa parte da população.
Tudo isso em um clima irônico, que desconstrói toda a aura comum nos heróis: o Comediante é um fascista hiper violento, a primeira Silk Spectre,uma mulher que explora a ultra sensualidade da fantasia, a segunda, sua filha, que entra na dança por imposição materna; Rorschach, cuja identidade é revelada apenas na prisão, dono de uma integridade ímpar, violência rara e moralismo tacanho, e muitos outros, interessantes e originais.
O fato é que a nostalgia é o tom constante na HQ, dado que os primeiros mascarados estão velhos e olham com saudades e ternura para tempos áureos.
O plano de Adrian Veidt, o Ozmandias, é muito próximo ao que já apareceu em várias criações de ficção científica, com em
Babylon V ou
Heroes: a concepção de que uma grande desgraça coletiva traria a paz forçosa e que a destruição de milhões de vida, salvaria bilhões.
Não posso falar mais nada, ou o post vira
spoiler, certo?
Quanto eu li essa graphic novel, no reveillon dos meus 22 anos, desejei ardentemente, que se tornasse filme. Com medo, porque porcas adaptações me dão arrepios.
A adaptação em questão, apesar de não captar essa ironia em relação a homens fantasiados combatendo o crime, consegue transmitir a nostalgia presente na HQ, consegue transpor para as telas personagens já-não-humanos, como dr. Manhattan e aquele eterno bonito-meio-bobo, como o segundo Nite Owl.
O filme tem uma trilha sonora incrível, só pecando algumas poucas vezes, tem a caracterização dos meus sonhos e procura ser bastante fiel a obra original, apesar dessa não ser a opinião de Alan Moore, cujo nome não aparece nos créditos.
O sonho americano, idealizado, ridicularizado e ressignificado, é isso que vemos em Watchmen. O sonho americano de malha colorida.